A história bizarra da revolução energética da América e o cowboy que ganhou e perdeu milhares de milhões de dólares em xisto. 

Entre 2006 e 2015, o mundo da energia foi virado do avesso por um desenvolvimento épico na indústria petrolífera que poucos tinham previsto. Enquanto em 2006 estavam no seu ponto baixo, importando 60% do seu petróleo, os EUA tornaram-se numa potência do petróleo, eclipsando tanto a Arábia Saudita como a Rússia, e, no final de 2015, eram o maior produtor mundial de gás natural.

Esta transformação impressionante foi provocada por empresários norte-americanos que descobriram como abrir rochas situadas a mais de um quilómetro abaixo da superfície da terra, para produzir gás e depois petróleo. Estas rochas, designadas por xisto betuminoso e antes consideradas impermeáveis, foram fragmentadas combinando duas tecnologias: a perfuração horizontal, na qual a broca pode percorrer mais de 3 quilómetros na horizontal, e o fracturamento hidráulico (também conhecido por “fracking”), no qual o fluido é bombeado para a terra a uma pressão elevada o suficiente para fragmentar rochas que contêm hidrocarbonetos; ao mesmo tempo, um material designado de “proppant”, geralmente areia, mantém as rochas abertas apenas uns milímetros para que os hidrocarbonetos possam fluir. Um empresário de fracking compara este processo à criação de corredores num edifício de escritórios que não tinha nenhum corredor, seguida de um simulacro de incêndio.

Em Novembro de 2017, a produção americana atingiu o recorde de 10 milhões de barris por dia estabelecido em 1970 – o último suspiro do lendário boom do petróleo. Segundo a Administração de Informação Energética dos EUA (“Energy Information Administration”- EIA), a expectativa para este ano é de atingir quase 11 milhões de barris por dia. O “Xisto de Marcellus”, que se estende pelo norte de Appalachia, poderá ser o segundo maior campo de gás natural do mundo, de acordo com os geólogos da Universidade de Penn State. Segundo a EIA, o gás de xisto é agora responsável por mais de metade da produção total dos EUA, enquanto que há uma década atrás a produção proveniente desta fonte era irrisória.

A aparente nova era da abundância energética americana já teve um impacto profundo em todo o mundo. Economias que dependiam do elevado preço do petróleo, desde a Rússia à Arábia Saudita, começaram a ter dificuldades. Esta situação teria sido impensável no mundo anterior a 2014, em que o petróleo valia 100 dólares por barril, e está a desenrolar-se de forma estranha e imprevisível.

Desde a década de 1970 que os presidentes dos EUA, de Gerald Ford aos Bush, têm salientado a importância da “independência energética”, embora o país se tenha tornado cada vez mais dependente, principalmente do Médio Oriente. Sob a administração Trump, o sonho de longa data da independência energética dos EUA tomou um rumo ainda mais grandioso e musculado. O Secretário do Interior Ryan Zinke tem falado sobre utilizar mais terras federais para extracção, incluindo parques nacionais, a fim de assegurar o “domínio energético“.

Temos debaixo de nós mais petróleo do que qualquer outro, e ninguém sabia disso até há 5 anos atrás”, disse Trump à imprensa a bordo do “Air Force One” no Verão de 2017. “E eu quero usá-lo. E não quero que isso nos seja tirado pelo Acordo de Paris. Não quero que eles digam que não podemos tirar partido de toda esta riqueza que os EUA têm debaixo dos seus pés, e que a China e outros países não têm.”

Mas a história de sucesso do xisto quase se tornou um desastre. Até à data, a maioria das queixas sobre o fracking têm-se centrado em preocupações ambientais, mas há uma razão maior e muito menos conhecida para duvidar das previsões mais utópicas sobre o futuro da América como gigante de petróleo e do gás. Nomeadamente, o fracking de petróleo assenta numa base financeira muito menos segura do que a maioria das pessoas imagina.

Uma vez que poucas empresas de fracking ganham dinheiro, o ingrediente mais importante do fracking não são os químicos, mas sim o capital, pois as empresas dependem da vontade de Wall Street para as financiar. Se as taxas de juro não fossem historicamente baixas, não é claro que teria havido sequer um boom de fracking.

Pode-se argumentar que a Reserva Federal Americana é inteiramente responsável pelo boom do fracking”, disse-me um gigante da industria de private-equity. Esta opinião é partilhada por Amir Azar, investigador do Centro de Política Energética Global da Universidade de Columbia, num relatório recente. “O verdadeiro catalisador da revolução do xisto foi a crise financeira de 2008 e a era de taxas de juro sem precedentes que ela desencadeou”. Outro investidor colocou as coisas da seguinte maneira: “Se as empresas fossem forçadas a viver de acordo com o os fluxos de caixa que produzem, o petróleo dos EUA não seria um factor no resto do mundo e teria subido apenas a uma taxa de um quarto a metade daquela a que cresceu realmente.”

As preocupações com a fragilidade financeira da revolução do fracking têm vindo a intensificar-se há algum tempo. John Hempton, que dirige o hedge fund Bronte Capital, sediado na Austrália, lembra-se de ter debates com o seu sócio quando o boom estava a começar. “O petróleo e o gás são reais”, dizia o seu sócio. “Sim”, respondia Hempton, “mas a sua economia não funciona”.

Até agora, a indústria de fracking tem sido mais resiliente do que qualquer um poderia ter imaginado. Mas as questões sobre a sustentabilidade deste boom já não estão limitadas a um pequeno grupo de cépticos. Estas dúvidas estendem-se agora aos conselhos de administração de alguns grandes investidores, bem como às salas executivas de pelo menos algumas das próprias empresas de fracking. O boom do fracking foi alimentado principalmente pelo excessivo capital de investimento, e não pelo fluxo de caixa.

Se a história do boom do fracking tem um actor principal, esse será Aubrey McClendon, fundador da Chesapeake Energy, uma startup que se tornou num colosso. Por um breve momento na história, ele foi o maior representante do fracking dos EUA no mundo. Ninguém estava mais certo e mais errado, mais ousado nas suas previsões ou mais espectacular nos seus fracassos, ninguém mais disposto a arriscar o dinheiro de outras pessoas e o seu próprio dinheiro do que McClendon; ou, como disse um banqueiro que conhecia bem McClendon: “O mundo move-se quando as pessoas que gostam de risco agem.”

“Ele era a cara bonita da indústria – a paixão, a criatividade, a audácia”, disse-me outro ex-banqueiro de investimentos. “Mas ele também era a face má.” E essa dualidade faz dele uma personificação perfeita da revolução norte-americana do fracking.

O magnata do fracking Aubrey McClendon, morto num acidente de viação em 2016. Fotografia: Layne Murdoch/NBAE/Getty Images

A morte de McClendon, tal como o seu legado, foi fortemente questionada. A 2 de Março de 2016, logo após as 9 da manhã, McClendon bateu com o seu SUV Chevrolet Tahoe num viaduto de betão debaixo de uma ponte na Midwest Boulevard, em Oklahoma City, morrendo instantaneamente. Ele ia em excesso de velocidade, não usava cinto de segurança e não parece ter feito qualquer esforço para evitar a colisão. Apenas um dia antes, McClendon tinha sido indiciado pelo Grande Júri Federal por violar as leis da concorrência durante o seu tempo como CEO da Chesapeake Energy. Os investigadores acabaram por considerar a sua morte um acidente, mas os rumores de suicídio persistem até hoje. Como disse à imprensa o Capitão Paco Balderrama, da polícia de Oklahoma City: “Podemos nunca vir a saber completamente o que aconteceu”.

No Outono de 2008, a revista Forbes tinha colocado McClendon em 134º lugar na sua lista dos 400 americanos mais ricos, com um património líquido estimado em mais de 3 mil milhões de dólares. Mas como ele pediu tanto dinheiro emprestado e fez empréstimos comerciais com garantias pessoais, os advogados ainda disputavam os restos dos seus bens 2 anos após a sua morte, tentando descobrir quais as dívidas que poderiam ser pagas: dos 500 mil dólares que ele devia aos “Boy Scouts of America” (Escoteiros Americanos) aos 465 milhões de dólares que ele devia a um grupo de credores de Wall Street, incluindo a Goldman Sachs. Os fundos abutre de Wall Street – os fundos de investimento que investem em dívidas de alto risco – tinham caído, comprando a dívida por menos de 50 cêntimos sobre o dólar, o que essencialmente implicaria que as dívidas não seriam pagas na tua totalidade. Portanto, não teria sido estranho se McClendon tivesse morrido falido. Durante os seus anos como magnata do petróleo e do gás, ele alimentou-se do risco e foi tão destemido como imprudente. Construiu um império que, a certa altura, produzia mais gás do que qualquer empresa americana, excepto a ExxonMobil. Uma vez, quando um investidor lhe perguntou numa conferência telefónica, “Quando é que atingirá o suficiente?”, McClendon respondeu sem hesitação: “Para mim nunca vai ser suficiente”.

Muitos pensam que, sem a habilidade de vendedor de McClendon e a sua incrível capacidade de atrair investidores, o mundo seria hoje um lugar muito diferente. Há muitas histórias sobre como, em conferências do sector, executivos de grandes empresas de petróleo como a Exxon estariam a falar para uma plateia quase vazia, enquanto outros lutavam literalmente por espaço na sala onde McClendon se encontrava. “Em retrospectiva, era como Camelot”, disse Henry Hood, ex-conselheiro geral e inicialmente consultor da Chesapeake, que trabalhou na empresa entre 1993 e a Primavera de 2013. “Houve um período de tempo que nunca será repetido, com uma empresa que nunca será repetida.”

“O bilionário mais imprudente da América”, chamou uma vez a Forbes a McClendon e, para muitos na indústria, essa manchete definiu o homem. Mas se ele era um vigarista, ele também se estava a enganar a si próprio. Porque ele acreditava. Ele foi, em muitos aspectos, a personificação de uma transformação que mudou a imagem não apenas das indústrias de petróleo e gás, mas também da geopolítica.

Nos dias mais negros do colapso dos preços do petróleo, em meados da década de 1980, McClendon, determinado como sempre, aproveitou a oportunidade para reunir pacotes de direitos de perfuração – de gás, não de petróleo – quer para serem vendidos a empresas maiores, quer para serem perfurados. Esta mera possibilidade torna a América quase única, uma vez que é um dos poucos países em que pessoas particulares, e não governos, detêm os direitos dos minerais sob suas propriedades. Para perfurar, basta convencer alguém a fazer um contrato de arrendamento. McClendon tornou-se no que é conhecido no sector de petróleo e gás como um “homem da terra” – a pessoa que negoceia os contratos de arrendamento que permitem a perfuração. Eventualmente isso faria dele a pessoa perfeita para o novo mundo do fracking, que não se limita a encontrar um único furo, mas mais a reunir os direitos de perfuração de vários poços. “Os homens da terra sempre foram os enteados da indústria”, disse ele mais tarde à Rolling Stone . “Geólogos e engenheiros eram os tipos importantes – mas apercebi-me muito cedo que todas as suas ideias sofisticadas não valem muito se não tivermos um contrato de arrendamento. Se você tem o contrato e eu não, você ganha.

Em 1983, quando McClendon tinha apenas 24 anos de idade, fez uma parceria com Tom Ward, também natural de Oklahoma, “fazendo negócios por pedaços de terra em Oklahoma, enviando faxes um ao outro a meio da noite”, disse Ward à Rolling Stone. Seis anos depois, os dois formaram a Chesapeake Energy, que recebeu o nome da amada baía onde a família de McClendon passava férias. Formaram-na com um investimento de 50 mil dólares.

Ward e McClendon não foram pioneiros tecnológicos. A maioria das pessoas concorda que essa distinção vai para um homem chamado George Mitchell, que se baseou em investigação feita pelo governo para fazer experiências no Xisto de Barnett, uma área de rochas estreitas na bacia de Fort Worth, no Norte do Texas. Combinando a perfuração horizontal com o fracturamento hidráulico, a equipa de Mitchell decifrou o código para extrair gás da rocha que se pensava ser impermeável.

“O capital está para o negócio do petróleo e do gás como o oxigénio está para a vida”, dito por Andrew Wilmont, um consultor, sedeado em Dallas, da empresa Purposed Ventures, para fusões e aquisições na indústria do petróleo e gás. “Esta indústria precisa de capital para funcionar ao máximo, e Aubrey McClendon é o fundador e pai da angariação de capital para o xisto nos Estados Unidos.”

“Ser capaz de pedir dinheiro emprestado durante 10 anos e sobreviver aos ciclos de expansão e retracção foi de uma perspicácia quase tão importante como a perfuração horizontal,” disse McClendon, com a sua imodéstia típica, à Rolling Stone.

Um local de fracking no Texas em 2017. Fotografia: Bloomberg via Getty.

A 12 de Fevereiro de 1993 – um dia que McClendon mais tarde iria descrever como o melhor da sua carreira – ele e Ward tornaram Chesapeake uma empresa cotada na bolsa de valores. Fizeram-no apesar do facto da sua empresa de contabilidade, a Arthur Andersen, ter emitido um aviso de “preocupação crescente”, que traduz a preocupação que havia na falência da empresa. McClendon e Ward decidiram mudar de empresa de contabilidade. “Tom e eu éramos homens da terra de 33 anos na altura e a maior parte das pessoas achava que não sabíamos o que estávamos a fazer, em retrospectiva eles estavam, provavelmente, pelo menos parcialmente certos.” disse McClendon a um entrevistador em 2006.

Na década antes de 2004, Chesapeake gastou cerca de 6 mil milhões de dólares adquirindo propriedade, companhias e concessões. McClendon, que chamaria mais tarde a estes anos “a grande corrida à posse de terras Norte Americana”, ganhou a reputação, entre os seus pares, de pagar mais do que devido. A sua agressividade não caiu nas boas graças da velha guarda do petróleo. “Toda a gente em Midland odiava a Chesapeake”, disse um deles. “Eles chegaram cá quando as concessões valiam 200-300 dólares por hectare. De repente eles estavam a pagar 2000-3000 dólares. Eles conseguiram boas localizações porque abalroaram todos os competidores. A sua atitude foi: ‘Saiam da frente, nós somos a Chesapeake.

“O estilo agressivo [de McClendon] pisou os calcanhares de muita gente na indústria” disse Andrew Wilmont. “Ele entrou em grande, fez os preços subir em flecha. Isso transformou algumas pessoas em milionárias, mas estragou a vida de muitas outras.”

McClendon iniciou uma vaga de gastos corporativos, que, hoje em dia, envergonharia os chefes de Silicon Valley. “Perguntarem-me o que fazer com dinheiro a mais é como perguntar a um estudante de faculdade o que fazer com uma cerveja.” disse McClendon à Natura Gas Intelligence em 2005. Também não era frugal em relação à sua vida pessoal. Adquiriu mansões e estâncias multimilionárias em Oklahoma, Bermuda, Maui, Vail, Lago Michigan, e Minnesota. Ele tinha uma das melhores colecções de vinhos do mundo.

McClendon estava a dar aos investidores de Wall Street o que eles mais queriam: consistência e crescimento. O ponto de venda dele era que o fracking tinha transformado a produção de gás, de uma questão de acertar-ou-falhar para uma de botão on-off. Estavam a criar e não a procurar. Ele tornou-se o porta-estandarte do gás natural – “Mr. Gas”, como chegou a ser chamado pela revista Fortune.

“Aubrey foi o primeiro a dizer, ‘Vamos criar a necessidade para isto’” disse Henry Hood da Chesapeake.

Em 2003, quando McClendon ainda estava a começar, o consenso era que os EUA estavam a ficar sem gás natural. Tornou-se numa obsessão de Alan Greenspan, o na altura reverenciado chefe da Reserva Federal, que avisou o Congresso, numa das suas raras aparições, que a escassez de gás e a sua subida de preço iriam prejudicar a economia Americana. Greenspan recomendou que os EUA construíssem terminais para receber gás em estado líquido de outros países. “Vemos uma tempestade no horizonte.” disse Billy Tauzin, um representante Republicano do Louisiana e, na altura, responsável pelo Comité de Comércio e Energia. Este medo ajudou a fazer passar a Energy Policy Act de 2005, que isentava os perfuradores de gás natural de tornarem públicos os químicos que usavam na fracturação hidráulica, evitando, desta maneira, o custo de algum tipo de supervisão.

À medida que o fracking descolava, McClendon começou a dizer a quem o quisesse ouvir que os EUA tinham gás natural suficiente para os próximos 100 anos. Começou, subtilmente, a financiar uma campanha intitulada “Carvão é sujo”, onde propunha que a conversão de 10% dos veículos nos EUA para gás natural, durante os 10 anos seguintes, seria a maneira mais barata de libertar a dependência do país em petróleo do estrangeiro. Ele estava convicto de que os seus funcionários deveriam todos conduzir veículos movidos a gás natural comprimido. Para um homem que estava mergulhado na história de expansão e retracção da indústria, McClendon convenceu-se a si próprio que os preços do gás natural nunca iriam cair. Preveu, em Agosto de 2008, que os preços se iriam manter entre os 8 e os 9 dólares durante os próximos tempos. “Ele tinha um ponto de vista muito, muito forte em relação ao gás natural,” disse um banqueiro que o conhecia desde o início dos anos 90. “Já agora, ele esteve errado durante os últimos 30 anos.”

A visão agressiva de McClendon em relação aos preços, tornou-se cultura geral no mercado energético. Em 2007, os investidores supostamente mais inteligentes do mundo – entre eles a Goldman Sachs e o titã das aquisições KKR – estruturaram de tal maneira a venda massiva de 45 mil milhões de dólares da utilitária TXU que, essencialmente, estavam a apostar na subida significativa do preço do gás natural, na altura a 7 dólares.

Ao mesmo tempo, Vladimir Putin estava a fazer apostas similares. Numa tentativa de criar um cartel para o gás natural, o Presidente Russo organizou um encontro de países produtores de gás, incluindo a Argélia, Irão e Venezuela, em Moscovo. Os EUA não fizeram parte. “O custo da exploração, produção e transporte de gás natural está a subir” disse Putin “Isto quer dizer que os custos de desenvolvimento da indústria vão subir em a pique. O tempo dos recursos energéticos baratos, do gás natural barato, está certamente a chegar ao fim.”

Quando as coisas se tornavam complicadas, McClendon sobrevivia sempre através de empréstimos para adquirir mais propriedades. “Simplificando, preços baixos curam preços baixos porque os consumidores são motivados a consumir mais e os produtores motivados a produzir menos,” escreveu no relatório de contas anual da Chesapeake, em 1998. Mas ele tinha-se esquecido do outro lado desse truísmo da indústria. Vezes e vezes sem conta, no mercado de mercadorias, preços altos motivam mais produtores a produzir, criando um excesso, que por sua vez esmaga os preços – e os produtores. “Ele tinha razão em relação ao xisto mudar o mundo” disse alguém da velha guarda do negócio do gás natural “Ele devia ter ouvido o seu próprio conselho.”

O preço do gás natural começou a cair em 2012, e, em 2014, o preço do petróleo seguiu a tendência. A queda de preços expôs a fraqueza do negócio do xisto nos EUA – custos altos e a necessidade constante de injecção de capital. A produção dos EUA, outrora estrondosa, desmoronou-se. A contagem de engenhos de perfuração – número de engenhos a perfurar petróleo ou gás natural em qualquer altura – caiu de 1920 no fim de 2014 para 480 no início de 2016. “Este nível só foi anteriormente registado na década de 1860, durante a expansão petrolífera da Pennsylvania” escreveu Paul Hornsell, director da pesquisa de mercadorias para o Standard Chartered Bank, numa pesquisa. A meio de 2016 a produção de petróleo nos EUA baixou para 1 milhão de barris por dia.

Várias companhias assoberbadas em dívidas começaram a declarar falência, umas atrás das outras, com cerca de 200 a terem de fechar. Num relatório emitido no Outono de 2016, pela agência de rating Moody, as baixas nas companhias envolvidas foram “catastróficas”. “Quando tivermos analisado todos os dados, incluindo as falências de 2016, é possível que se descubra que a crise na indústria do gás natural e do petróleo tenha criado uma falência neste segmento de mercado, de proporções históricas,” disse David Keisman, Vice-Presidente Sénior da Moody.

Muitos dos que tinham comprado mais valias a McClendon, e outros, no auge do mercado, começaram a descartar o valor do que tinham adquirido. A Statoil, um gigante energético Norueguês, deu baixa do seu xisto e mais valias no petróleo Canadiano, no valor de 4 mil milhões de dólares; a Royal Dutch Shell deu baixa acima dos 8 mil milhões de dólares. A mais marcante foi a australiana BHP Biliton, que havia investido 5 mil milhões de dólares a par com a Chesapeake em xisto da Fayetteville e outros 15 mil milhões de dólares na compra da Petrohawk, sedeada em Houston. A BHP colocou todas a suas mais valias à venda no Outono de 2014, para as quais não encontrou compradores, dando eventualmente baixa de 7 mil milhões de dólares – o que deu origem ao comentário “fazer como a BHP”.

Nas palavras de um investidor: “Todas as aquisições de xisto feitas por grandes companhias, incluindo as internacionais, foram desastrosas. Os vendedores fizeram muito dinheiro, mas as empresas não.”

Enquanto as empresas de xisto cortavam os seus orçamentos, o equipamento de fracking ficava parado – a empresa de investigação IHS Markit, reportou que em 2016, cerca de 60% do equipamento de fracking nos EUA estava inactivo. Companhias de xisto e de campos de petróleo despediram vários trabalhadores. Segundo as contas da empresa de consultoria Graves & Co, a indústria global de petróleo e gás despediu cerca de meio milhão de trabalhadores.

As cidades criadas durante a expansão do xisto, rapidamente se transformaram nas suas homólogas durante a Corrida ao Ouro. No manto de xisto de Cline, a este de Midland, no Texas, a Devon Energy baixou a actividade das suas plataformas e deixou as suas concessões expirarem, declarando que a formação tinha “demasiada variabilidade”. Na cidade de Sweetwater “as ambições estão a desmoronar-se, enquanto a queda do preço do petróleo afasta cada vez mais investidores e, com eles, o financiamento dos projectos que iriam financia um futuro melhor” escreveu a Associated Press em 2015. “Agora a cidade de 11.000 habitantes aguarda enquanto os despedimentos e os cortes orçamentais colocam os seus sonhos em espera.”

Fosse por que métrica fosse, a expansão do xisto tinha rebentado. No início de 2016, obrigações de não-investimento no mercado energético – o combustível da indústria do xisto – valorizavam a 25%, cinco vezes mais do que há um ano e meio atrás, o que é um indicativo de alto risco. “Isto tem todos os traços de uma gigantesca crise de financiamento” para as empresas de energia, disse William Snyder, director da unidade de reestruturação nos EUA da Deloitte, ao Wall Street Journal no início de 2016. Nessa primavera, a Reserva Federal de Kansas City, concluiu que “os preços actuais estão demasiado baixos para que a produção de petróleo de xisto seja viável a longo prazo.”

Analisando a carnificina da primavera de 2016, o então CEO da ExxonMobil, Rex Tillerson, disse numa reunião com analistas, que devido ao elevado endividamento que as companhias desta indústria tinham acumulado, ele não conseguia sequer encontrar nada que valesse a pena comprar.

Quando Aubrey McClendon morreu no seu carro, durante uma colisão a 145km/h contra uma parede de betão armado que suportava um viaduto, foi difícil não ver a sua morte como o ponto final de uma era. Como perguntou o gestor de fundos de risco australiano John Hempton: “Será que Chesapeake é o modelo para este negócio? Muda o mundo, mas acaba em lágrimas?”

Este artigo é um extracto editado da Saudi America por Bethany McLean, publicado pela Columbia Global Reports em 12 de Setembro de 2018. 

Fonte: theguardian.com

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