Há décadas que a indústria fóssil pressiona e negocia para que o gás fóssil seja percecionado e aceite como “transição justa” e “energia verde”. A invasão da Rússia à Ucrânia e o bloqueio ao gás russo acionou uma corrida desenfreada para a construção de novas infraestruturas tal como novos contratos para importação de gás fóssil. Este terá como único objetivo aumentar o lucro dos acionistas e como único fim uma catástrofe climática sem precedentes.

Vamos fazer uma breve analise à situação atual:

  • O plano em curso não é novo e falhou: como explicitado no novo relatório “LNG: The liquid path to climate chaos” as conversações sobre a diversidade no fornecimento de gás têm marcado uma presença ávida na agenda da UE já há vários anos, precisamente depois das crises de gás da Ucrânia e Rússia em 2006 e 2009 e da anexação da Crimeia em 2014. Ainda assim, apesar dos milhares de milhões de euros investidos em mais condutas de gás e terminais de importação de GNL para permitir o fluxo de gás não-russo na Europa, a quota de gás russo na UE aumentou na última década e a dependência do gás agravou-se.
  • Gás fóssil é caro e movido pelo lucro: Em 2019, estimou-se que 1 em cada 4 agregados familiares (mais de 50 milhões de pessoas na Europa), não conseguia pagar por aquecimento, arrefecimento ou luz adequados nas suas casas.i Entre 2019 e 2021 o preço grossista do gás fóssil na UE aumentou em média mais de 400%, deixando cada vez mais pessoas em pobreza energética.ii Ao mesmo tempo, as empresas de gás fóssil estão a ver os seus lucros a aumentar drasticamente. Entre Julho e Setembro de 2021, à medida que os preços do gás começaram a subir, os 20 maiores produtores de gás do mundo obtiveram lucros de 65 mil milhões de dólares.iii
  • Todos os locais de exploração de gás fóssil estão a alimentar violência e instabilidade: vimos em cima a realidade na Nigéria e como esta é a norma. Novos contratos de importação de gás com outras empresas e países só alimentará conflito, instabilidade e crise climática.
  • Não precisamos de mais infraestrutura para gás fóssil: em Abril de 2022 o Global Energy Monitor reportou que a infraestrutura para importação, distribuição e tratamento de gás na Europa é mais do que a necessária para colmatar as necessidades atuais e dos próximos anos, mesmo excluindo as infraestruturas na Rússia e em conexão com esta. Isto significa que não é necessário construir novos gasodutos, portos ou expansão dos mesmos. É de notar que as próprias metas climáticas da União Europeia, que estão aquém do que é necessário, são incompatíveis com uma extensão e amplificação da infraestrutura de gás fóssil.
  • Temos de parar de explorar combustíveis fósseis: não só é um crime contra a humanidade iniciar novas explorações de combustíveis fósseis, inclusive gás, como cerca de metade dos locais de extração de combustíveis fósseis existentes precisam de ser encerrados antecipadamente para que o aquecimento global seja limitado a 1,5C.
  • Gás fóssil está a desviar os fundos de uma real transição energética: em Fevereiro de 2022 a Comissão Europeia alargou os critérios de financiamento verde para incluir nuclear e centrais a gás, apesar de múltiplas objeções. Está assim aberta a porta para que o financiamento para transição energética seja desviado para a construção de infraestrutura obsoletas com o fim de aumentar o lucro da indústria fóssil.

Não podemos ficar refém de negócios caros e de longo-prazo, que nos aprisionam a infraestruturas de combustíveis fósseis.

Uma transição para uma energia justa, limpa e acessível é urgente. A transição para 100% energias renováveis é o plano anti-guerra que garante a soberania e independência energética, colmata a pobreza energética e garante a resiliência das comunidades e ecossistemas.


i – https://righttoenergy.org/wp-content/uploads/2019/02/ep-report-18.02.19.pdf

ii – https://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/TXT/PDF/?uri=CELEX:52021DC0660&from=EN

iii – https://www.globalwitness.org/en/campaigns/fossil-gas/big-gas-profits/

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