A propósito das declarações do Ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, de que para o Governo português, “não faz parte do roteiro [para a neutralidade carbónica] a exploração do gás natural”, somos levados a pensar que, na verdade, existe uma forte possibilidade de fazer.
Recordemos o que Matos Fernandes disse, no passado dia 10 de Dezembro, em Madrid, sobre os contratos de concessão para prospeção e exploração de gás na Bajouca e em Aljubarrota: “estamos muito longe de saber se vai ou não haver verdadeiramente uma exploração. Aliás, até para a prospeção foi pedido um estudo de impacto ambiental. Esse estudo está a ser feito, vamos avaliá-lo e mais à frente se há ou não possibilidade de haver essa mesma exploração. Neste momento não há aqui nenhuma decisão para tomar”.
Com a necessidade de uma redução de 50% do total de emissões de gases com efeito de estufa até 2030, para limitar o aumento da temperatura média terrestre a 1.5º C face a níveis pré-industriais, a afirmação sobre não haver nenhuma decisão para tomar afigura-se como bastante questionável. Para que esta meta seja atingida, é urgente que sejam tomadas decisões ambiciosas e vinculativas, que permitam que nos desviemos de um futuro de caos climático e social.
Contudo, e apesar da forte oposição da população, dos movimentos de combate às alterações climáticas, da comunidade científica, das autarquias e das comunidades intermunicipais, o Ministro do Ambiente contradiz-se, ponderando ainda se as “supostas explorações de gás fóssil” serão ou não possíveis e rentáveis.
Porque entendemos que deve existir um compromisso sério no combate às alterações climáticas e que todas as ações nesse sentido são importantíssimas, transcrevemos aqui o texto integral da moção que a Câmara Municipal de Leiria aprovou a 17 de dezembro, por unanimidade, uma moção conjunta do PSD e PS, que pede ao Governo que tome as medidas necessárias para impedir a prospecção e exploração de gás no concelho de Leiria.
Moção conjunta contra a prospeção e exploração de gás na Bajouca
Relativamente aos contratos em vigor entre o Governo e a Australis Oil & Gas, Sociedade Unipessoal, para a concessão de direitos de prospeção, pesquisa, desenvolvimento e produção de petróleo nas áreas designadas por Pombal e Batalha, a Câmara Municipal de Leiria
Considerando:
a) Que a Assembleia da República já se pronunciou, por unanimidade, contra a exploração de Gás na Bajouca;
b) Que numerosas associações e instituições ambientalistas têm alertado para os perigos da prospecção e exploração de Gás na Bajouca;
c) Que vários países da Europa, nomeadamente Alemanha e outros, recentemente proibiram ou restringiram a exploração de gás;
d) Que a grande maioria da população da Bajouca já se pronunciou contra;
e) Que os órgãos locais, nomeadamente a Junta de Freguesia e Assembleia de Freguesia da Bajouca já se pronunciaram contra este processo;
f) Que os prejuízos com a exploração de gás vão atingir os pontos de abastecimento de água que servem grande parte da população do norte do concelho de Leiria, para além dos prejuízos a nível da qualidade do ar e do Turismo do concelho;
g) Tendo em conta, a carta enviada pelo Presidente da Câmara Municipal ao Ministro do Ambiente;
h) Que existe unanimidade na classe científica quanto ao impacto negativo que as emissões resultantes da utilização de combustíveis fósseis representam para o aquecimento global;
i) Que o governo Português assumiu na cimeira do Clima em Marraquexe, no dia 15 de Novembro 2016, na pessoa do então e atual primeiro ministro, Dr. António Costa, o inabalável compromisso de Portugal ser neutro em termos de emissões de gases com efeito de estufa até ao final da primeira metade do presente século;
j) Que Portugal pretende, até 2030, alcançar 50% de redução do total de emissões de gases com efeito de estufa;
k) Que o Ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, afirmou dia 10/12/2019, no âmbito da 25.ª Conferência das Partes (COP25) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, que, pelo Governo português, “não faz parte do roteiro [para a neutralidade carbónica] a exploração do gás natural”.
l) Que o Ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, escreveu uma carta à ativista Greta Thunberg em que afirma que Portugal é um dos países europeus que mais sofre com as consequências das alterações climáticas e que Portugal tem uma estratégia muito ambiciosa que segue com rigor tratando o problema como atual e não de futuro;
m) Que nos últimos anos têm sido múltiplos os fenómenos extremos que têm assolado a região de Leiria: O avanço do mar na costa, em especial na nossa Praia do Pedrógão em 2013; o trágico incêndio do Pinhal de Leiria em 13 outubro 2017; e a tempestade Leslie, que, dia 15 out 2018, deixou um profundo rasto de destruição nesta região.
n) Que na freguesia da Bajouca, onde se localiza a expectativa de realização de furos de prospeção no âmbito do contrato em área de concessão designado por Pombal, é unânime a discordância profunda da população local a este projeto, por alterar radicalmente a sua forma de vida e economia local, baseada em agricultura, sobretudo de subsistência, pequena indústria e serviços, mas sobretudo por vir hipotecar modelos de desenvolvimento futuro alinhados com o que se perspetiva para Portugal, suportado na neutralidade carbónica;
o) Que a Assembleia Municipal de Leiria aprovou por unanimidade uma moção contra a prospeção e exploração de gás na freguesia da Bajouca
p) Que os dois contratos em vigor entre o Governo e a Australis Oil & Gas, Sociedade Unipessoal, estão em contradição com a política energética que Portugal tem vindo a prosseguir na última década,
q) Que é urgente implementar rapidamente práticas maciças de eficiência e conservação de energia e substituir combustíveis fósseis por fontes renováveis de baixo carbono e outras fontes de energia mais limpas;
A Câmara Municipal de Leiria manifesta a sua total oposição à prospeção e exploração de gás natural na Bajouca e em todo o Concelho de Leiria, e pede ao Governo que tome as medidas necessárias para esse fim.
Leiria, 17 de dezembro de 2019