enormes quantidades de metano a serem libertadas para o ambiente pelas infraestruturas de gás e petróleo nos Estados Unidos. No oeste do estado do Texas, mais precisamente na chamada Permian Basin, há milhares de instalações de gás e petróleo que tornaram os Estados Unidos no maior produtor mundial de petróleo e gás.

 

Uma investigação do New York Times foi realizada por dois jornalistas no terreno, a bordo de uma aeronave repleta de equipamento científico, para dar a conhecer as fugas de metano nesta zona (que é maior do que o estado do Kansas). Em poucas horas, o equipamento a bordo do avião identificou seis campos petrolíferos com níveis de metano muito acima do normal, visíveis através de uma câmara altamente especializada.

 

O metano é o componente principal do gás natural, tem um elevadíssimo poder de efeito de estufa, e está a contribuir para o aquecimento global a uma velocidade alarmante. Os dois jornalistas revelaram que a pressão exercida pelas companhias donas dos campos petrolíferos está a conseguir enfraquecer progressivamente a regulamentação para o controlo das emissões de metano. As companhias locais, juntamente com grupos lobistas que representam as grandes companhias energéticas do mundo, estão a lutar contra regras que as obrigariam a aplicar um maior controlo sobre emissões como estas. É possível que a administração Trump avance com um plano para eliminar efetivamente todos os requisitos que as petrolíferas são obrigadas a cumprir para a detecção e eliminação de fugas de gás e petróleo. Segundo cálculos da própria Environmental Protection Agency (E.P.A.), isso aumentaria as emissões de metano em 370 mil toneladas, até 2025, o suficiente para fornecer energia a um milhão de casas durante um ano.

 

Do ar, os dois jornalistas fizeram o levantamento de dois condados no seio da Permian Basin. Depois dirigiram-se ao local, armados com câmaras de infravermelhos, e detectaram metano a jorrar às golfadas de tanques, a sair de tubos com fugas, e de chamas destinadas à queima do gás, mas que por vezes falham por completo.

 

O desmantelamento das normas regulamentares tão desejado pela indústria de energia, é o último capítulo de uma tentativa sem precedentes, levada a cabo pelo actual governo dos EUA, que visa a diminuição dos regulamentos de protecção do ambiente e do clima. Os cientistas afirmam que as investigações apontam para emissões de metano muito superiores ao estimado previamente mas este assunto é desconsiderado pelo actual governo. Os níveis de metano têm subido em flecha desde 2007, por razões ainda não totalmente conhecidas, sendo a extracção de gás por fracturação hidráulica, fracking, o primeiro suspeito.

 

As fugas de metano deitam por terra a narrativa falsa das vantagem do gás sobre o carvão e do gás como uma solução de transição, pois a queima do gás para produção de electricidade, embora produza metade do dióxido de carbono produzido pelo carvão, quando o metano não é queimado ao ser liberto, tem um potencial de aquecimento 80 vezes superior ao do dióxido de carbono, num período de vinte anos. Robert Howarth, cientista de sistemas terrestres na Universidade de Cornell, estima que o gás produzido por fracking nos EUA tenha aumentado as emissões de metano em um terço, a nível global, nos últimos dez anos. O metano também contribui para o ozono a nível do solo que, quando inalado, pode causar asma e outros problemas de saúde.

 

Em quatro horas de voo, numa zona conhecida como a Barnett Shale Basin, também no Texas, foram detetados pelo menos outro seis locais com altos valores de emissões de metano, desde 136kg a quase 498kg por hora. De acordo com um estudo de 2017, emissões de metano de 27kg por hora foram classificadas como super-emissões, uma categoria que as anteriores ultrapassam largamente.

 

A detecção de emissões de metano é um trabalho difícil. Paul Wilczack, piloto e cientista de voo da Scientific Aviation, uma companhia de detecção de fugas do ar, foi o responsável por esta investigação. Nos campos de gás e petróleo não é obrigatório ter monitores de emissões 24h por dia, portanto estes voos são um dos poucos meios disponíveis para fazer estas medições.

 

Com a câmara de infravermelhos, foram depois fotografadas em terra as emissões vistas do ar. Num dos locais, a câmara transforma um campo aparentemente tranquilo num autêntico inferno, com colunas de gás quente a disparar para o ambiente, e nuvens de emissões a envolver estruturas inteiras. A regulamentação no Texas permite que as empresas reportem emissões ilegais e não sejam penalizadas. Algumas empresas que foram abordadas com os resultados desta investigação, não respondera às averiguações, outras não fizeram qualquer comentário.

 

Nas instalações de processamento de gás da Eagle Claw Midstream o gerente abordou a equipa de filmagens, e comentou: “não sabíamos que havia fugas”, e o trabalhador enviado para verificar o problema subiu uns degraus e entrou diretamente na nuvem. Concluiu que as emissões eram simplesmente vapor de água. “Não há problema” disse ele, “não o vamos reportar”. Mais tarde a Eagle Claw fez uma declaração em que disse que os trabalhadores tinham de facto detectado que a válvula do depósito em questão precisava de manutenção, e que o problema tinha sido resolvido em meia hora. Até ao fim de 2019, a companhia não registou qualquer relatório de incidente com emissões.

 

As tentativas feitas pelos lóbis das petrolíferas junto do governo para atenuar a regulamentação sobre emissões de metano, remontam a Março de 2017, escassos meses após a eleição do presidente Trump. Argumentaram alguns que a monitorização mais frequente seria economicamente inviável, e regulamentos mais rígidos teriam um preço demasiado alto. Esta mobilização fez parte de uma movimentação maior por parte da indústria, de modo a inverter regulamentos da era Obama que teriam obrigado os operadores a controlar e a reparar mais eficazmente as fugas, e a reduzir as “erupções”.

 

Já em Março de 2018, a Independant  Petroleum Association of America que representa milhares de companhias de gás e petróleo nos EUA, pôs a circular material que refutava fortemente as provas científicas de grandes quantidades de emissões provenientes de fugas nos locais de perfuração, afirmando que “criavam a ilusão” que as super-emissões eram um problema. Este foi recebido por um governo pronto a dar-lhe ouvidos. Antes de ser nomeado vice-administrador da E.P.A. com a tutela da poluição ambiental, William L. Wehrum era lobista pelas companhias de gás e petróleo. Em Agosto deste ano, já a E.P.A. tinha proposto um desmantelamento significativo da regulamentação vigente, incluindo a revogação completa de regulamentos diretamente relacionados com as emissões de metano. Wehrum pediu a demissão do cargo em Junho, e está a ser investigado pelos seus contactos com os seus anteriores clientes. Não respondeu a um pedido de comentário.

 

Embora as gigantes petrolíferas como a BP, Exxon Mobil, Chevron e Shell defendam publicamente a regulamentação do metano, as associações comerciais que as representam têm lutado contra estas. Algumas companhias têm de facto tomado medidas de controlo de fugas e “erupções”, mas teme-se que a desaceleração na produção, devida à abundância de gás e aos preços extremamente baixos, façam com que a detecção de metano não seja uma prioridade, particularmente para as empresas mais pequenas. Foi o caso da MDC Texas Operator onde foi identificado um volume significativo de fugas com a câmara de infravermelhos, e que entrou em falência no dia a seguir. As tentativas de contacto telefónico não obtiveram resposta, e os advogados de falência não responderam aos pedidos de comentário. Não é sabido se os depósitos continuam a expelir gás para a atmosfera.

 

Link para o artigo completo no The New York Times, onde se podem ver as imagens das câmaras de infravermelhos: https://www.nytimes.com/interactive/2019/12/12/climate/texas-methane-super-emitters.html

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