As organizações da Campanha “Gás é Andar para Trás” denunciam a Estratégia Nacional para o Hidrogénio, agora em consulta pública, como dando demasiado protagonismo ao gás fóssil, uma das fontes mais significativas de gases com efeito de estufa. A Campanha considera que, apesar do hidrogénio produzido a partir de fontes renováveis ser uma oportunidade para a descarbonização, diversos aspetos mencionados nesta Estratégia, como o recurso à infraestrutura de gás natural nas próximas décadas, põem claramente em causa a urgente transição energética rumo à neutralidade carbónica.
A “Estratégia Nacional para o Hidrogénio” do Ministério do Ambiente e Ação Climática encontra-se em consulta pública até 6 de julho. Esta Estratégia antecipa em quase 10 anos as metas para o hidrogénio propostas antes no Plano Nacional de Energia e Clima 2030. No entanto para a Campanha “Gás é Andar para Trás”, esta Estratégia não aproveita o potencial de produção de hidrogénio (H2) e mantém a infraestrutura de gás existente: começando nas centrais termoelétricas e acabando nos autocarros movidos a gás.
A Campanha aponta que a Estratégia não prevê a antecipação das metas de produção de energia solar e eólica por forma a gerar excedentes suficientes para produzir o hidrogénio proposto para 2030. A Campanha nota também a ausência de um plano concreto e calendarizado de substituição e adaptação de equipamentos ao consumo de H2, onde e quando este for energeticamente mais eficiente que outras alternativas eléctricas, prevendo-se antes a exportação de uma parte substancial do hidrogénio a produzir, em vez de dar prioridade à satisfação do consumo interno.
Assim, entre outras coisas, a Estratégia Nacional para o Hidrogénio passa por:
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Implementar uma grande capacidade de geração de energia solar fotovoltaica e eólica em Sines (cerca de 1GW), que, em vez de servir para substituir parte da energia fóssil que importamos, será usada exclusivamente para produzir hidrogénio;
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Esse hidrogénio será parcialmente destinado a exportação, com injeção de apenas 10 a 15% de H2 na rede de gás, e 1 a 5% no transporte rodoviário movido a gás, até 2030 – valores que terão um impacto irrisório na redução de emissões, isto na década em que se exigem as reduções mais drásticas;
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A exportação deste hidrogénio será feita via porto de Sines, anulando muitas das vantagens da produção de hidrogénio a partir dos excedentes de eletricidade renovável e contribuindo para aumentar as emissões de gases com efeito de estufa associadas ao transporte marítimo, sector em que as emissões têm crescido muito rapidamente.
Na atual versão, os ativistas consideram que a Estratégia parece antes de tudo servir os interesses da indústria de combustíveis fósseis, definindo um curso de investimento que ajuda a assegurar o protagonismo do gás na produção energética nacional até 2050. O sumário executivo da Estratégia sugere também esta motivação, ao referir-se à “resistência no sector do gás e em alguma indústria” perante os objetivos de descarbonização e eletrificação enunciados nos planos anteriores do governo (Plano de Energia e Clima 2030).
As organizações que formam a Campanha “Gás é Andar para Trás” defendem que não podem ser os interesses das empresas que extraem, armazenam e transportam gás fóssil a ditar o ritmo a que respondemos à emergência climática. Defendem ainda ser necessário o mesmo sentido de urgência e de atenção à ciência que tivemos durante a crise pandémica para responder à crise climática.
De acordo com o IPCC, para manter a temperatura média do planeta estável, a neutralidade carbónica deve ser atingida à escala mundial em 2044. Os países mais desenvolvidos, incluindo Portugal, pela sua responsabilidade histórica de emissões e maior capacidade tecnológica e de investimento, têm um prazo mais curto.
A Campanha entende que não é este o momento de voltar à normalidade de consumo de combustíveis fósseis que existia pré-pandemia. É, sim, antes altura de investir fortemente na redução estrutural de emissões. Por isso a Estratégia Nacional para o Hidrogénio não pode ser uma oportunidade perdida. A Campanha “Gás é andar para trás” disponibiliza informação básica sobre este tema e sobre como participar na consulta pública em gasparatras.pt, e deixa um apelo alargado à participação nesta consulta pública.